31 agosto 2007

II Desafio Intermodal Carioca

Pois é... eu sei que o nome do Blog é A Bicicleta do Sapo, mas parece que deixaram a magrela em casa dessa vez.

Vai como então?
- A pé!
Da onde pra onde?
- Central ao Leblon
Mas porque isso?
- Vou te contar...

Nesse último dia 30 de agosto aconteceu o II Desafio Intermodal na cidade do Rio de Janeiro. Esse evento, promovido pela ONG Transporte Ativo, tem o objetivo de comparar o uso de diversos meios de transporte sob varios aspectos, como tempo, praticidade, comodidade, preço, entre outros.

A concentração estava marcada para 17:15, em frente ao Palácio Duque de Caxias na Central. Cheguei uns dez minutos antes para poder fazer um reconhecimento do local. Já estavam lá três pessoas que iam de Metrô até o Cantagalo e depois, duas delas, iam andando ou pedalando a bicicleta (desmontável, que dava pra carregar como uma mala) até a Praça Antero de Quental. Logo depois foram chegando os representantes dos outros modais de transporte; Carro, moto, patins, skate, ônibus, taxi e outras bicicletas...

O Pessoal estava animado, só esperando o relógio da Central anunciar que eram 18:00 para que começasse o desafio. Tão ansiosos que, reparem na foto, esse que vos fala nem olha para a câmera...


Foi dada a largada!
Pra mim foi fácil... a minha chave já estava na ingnição e a pedaleira que precisava já estava comigo desde que nasci!

A descrição do meu caminho pode ser vista aqui!
Vejam!! é só clicar,apertar Start Tour e ir seguindo com as setinhas...

Tive que enfrentar alguns incovenientes nos treze quilômetros que percorri. A borda da Praça da República quase não tem calçada, a Rua do Catete é invadida pelo comércio, e durante todo o trajeto tive que respirar a fumaça gerada pelos veículos, que em sua maioria só transportam uma pessoa.

Além dos vendedores, adivinhem quem também eu encontro em algumas calçadas? Não satisfeitos em fazer estas ficarem menores para que eles tenham mais espaço na via, os carros ainda vem parar nos últimos metros quadrados que nos restam...

Depois que cheguei na Lagoa, zona sul, terra de bacana, a corrida foi ótima até o fim! Foi como se fosse um passeio. Apesar do cansaço, deu pra aproveitar bem o momento e ser, feliz, o último colocado, chegando 79 minutos após o primeiro passo no centro.



Chegando na praça tive a felicidade de encontrar todos os sorridentes participantes que saíram do centro. Os que chegaram primeiro foram o Carro, a Moto e a Bicicleta desmontável que viajou de Metrô até o cantagalo, todos chegando em 42 min. Os motorizados deram sorte no trânsito...



Olha o tempo do pessoal todo
(veja mais no
Blog da Transporte Ativo)

Carro 42 min
Moto 42 min
Metrô-Bicicleta 42 minutos
Táxi 43 minutos
Bicicleta Masculino 47 minutos
Metrô-Skate 48 minutos
Ônibus 54 minutos
Metrô-Patins 56 minutos
Metrô-Ônibus 58 minutos
Bicicleta Feminino 58 minutos
Metrô-Pedestre 67 minutos
Bicicleta Ciclovia 69 minutos
Pedestre 79 minutos

Correr nesse Desafio foi maravilhoso! Além de eu estar feliz por participar de uma iniciativa que é tão importante para a conscientização do carioca sobre as possibilidades e consequências, para si e para os outros, da escolha do seu meio de transporte, a aventura foi inesquecível.

Parabéns aos participantes e organizadores do evento!

Até o ano que vem!

Abraços...

14 agosto 2007

CALIBRE OS PNEUS, CALIBRE OS PULMÕES E FORÇA NO PEDAL

por J. M. Tamas




- Juro, juro que se eu soubesse não o teria deixado entrar. São oito horas da noite e eu estou repetindo essa frase desde às onze da manhã, hora em que o Nivaldo saiu da minha casa, pois além de simpático ele é de uma pontualidade britânica. Em exatamente 30 minutos ele conseguiu transformar o meu belo domingo de sol em um tormento existencial familiar. Às exatamente dez e meia - e eu só sei que foi exatamente porque a campainha tocou junto com o cuco do relógio -, a campainha toca e eu vou atender, enquanto a minha mulher corre para a cozinha “pra preparar um delicioso cafezinho pras visitas”, e minha filha gruda na minha perna - ritual que se repete cada vez que toca a campainha: eu na porta com uma metade de gente se escondendo atrás de mim, e minha digníssima cara metade na cozinha preparando café para sei lá que visita.

- Bom dia, como vai o senhor? Que gracinha de menina ! Tá se escondendo atrás do papai, é? Como é o seu nome, hein?

Isso tudo disse o Nivaldo antes que eu pensasse em alguma coisa.

- Bom dia, foi a única coisa que eu consegui falar antes que ele voltasse ao ataque.

- Eu gostaria de discutir alguns problemas do nosso bairro com o senhor.

Eu esqueci de dizer que o Nivaldo é um desses rapazes que a gente viu nascer, crescer, jogar bola na rua e entrar para a faculdade. Ou seja, um representante legítimo do bairro em que moramos.

- Veja só o senhor que o crescimento desordenado das cidades tem provocado uma aglomeração humana que foge completamente aos índices suportáveis para uma vida saudável. Veja, por exemplo, que os ruídos e a poluição provocados por automóveis, ônibus e caminhões dentro das grandes cidades já ultrapassaram há muito o limite suportável pelo ser humano. E o senhor sabe pra quê? Para andar a 40 km/h!

Nesse momento ele me estendeu uma coisa tipo apostila, que eu só consegui perceber que eram dados de uma pesquisa. E voltou imediatamente ao ataque.

- O senhor não acha um absurdo fazer carros tão velozes para andar a uma média de 40 km/h? Pois é isso que acontece: 40 km/h!

Eu não sei se para minha sorte ou azar, entrou em cena nesse momento a minha prezada senhora com seu “delicioso cafezinho pras visitas”.

- Olha o cafezinho. Olá, Nivaldo, como vai sua mãe? Aceita um cafezinho? Tá fresquinho!

- Não, obrigado.

Minha digníssima esposa colocou, muito surpresa, a bandeja na mesinha de centro e sentou-se na poltrona, um tanto estarrecida.

- A senhora entende que a enorme quantidade de cafeína existente no café, somado ao açúcar utilizado para adoçá-lo, provocam no organismo uma aceleração...

E eu não quis saber aceleração de quê.

- Por favor, Nivaldo, o automóvel a 40 km/h economiza mais...

- Não economiza nada. Muito pelo contrário, gasta mais, pois a aceleração e a desaceleração constantes causada pelos engarrafamentos são responsáveis pelas maiores taxas de consumo de combustível nos grandes centros urbanos - e me estendeu outra apostila com dados de uma pesquisa qualquer sobre combustível.

A essa altura eu tinha quase certeza de que estavam sendo lançadas, dentro da minha casa, as bases de um partido ecológico, ou que o Nivaldo queria me vender uma coleção do tipo “Enciclopédia da Vida Natural”. E foi nesse exato momento que a metade de gente que continuava grudada na minha perna - benditas sejam as crianças - fez a pergunta que faltava.

- Papai, o que o moço quer, hein?

- Era exatamente sobre isso que eu ia falar agora, respondeu de imediato o Nivaldo. Eu estou aqui como representante de uma campanha nacional que tem como objetivo incentivar as pessoas a trocar seus automóveis usados por bicicletas novas. Veja o senhor: se todas as pessoas fossem ao trabalho de bicicleta, a economia de combustível seria fenomenal, as populações dos grandes centros urbanos ficariam livres do barulho e da fumaça e as cidades seriam mais humanas! Além disso, praticando um esporte saudável, todos ficariam mais bem dispostos para a batalha do dia-a-dia.

- Mas, Nivaldo, o que será feito dos carros? Quem vai comprar todos esses automóveis? - perguntei meio atônito.

- Exportação, meu caro. Exportar é a solução. Divisas para o país! O senhor já imaginou, hoje domingo, o senhor e a sua família toda andando de bicicleta juntamente com outras famílias do nosso bairro, numa cidade sem poluição, com as ruas calmas e silenciosas, os passarinhos cantando nas árvores ...

- Tá bom, Nivaldo. Tá bom! Você tem todo o meu apoio. O que eu preciso fazer.

- Basta assinar a nossa lista de apoio à campanha, que já conta com 50 mil assinaturas em todo o país. E esse catálogo aqui é para o senhor escolher o seu PLANO DE TROCA. O senhor tem várias opções, desde trocar o seu carro muito velho por uma bicicleta muito nova, até trocar o seu automóvel muito novo por várias bicicletas novas e um apartamento usado. São ao todo 183 planos com as mais variadas opções. Para qualquer orientação, basta o senhor me telefonar. E agora me dá licença que eu tenho que visitar outras pessoas. Até logo e muito obrigado pelo seu apoio.

E foi assim que, exatamente quando o cuco batia onze horas, o Nivaldo fechou a porta e partiu como um cometa, levando a minha assinatura e me deixando com um PLANO DE TROCA na mão, um conflito na cabeça e uma filha que não pára de repetir:

- Papai, eu quero a bicicleta do moço!



texto publicado no jornal Citibank News nº 80 de fevereiro de 1982
revisado pelo autor em agosto de 2007